terça-feira, 17 de setembro de 2013

RIACHUELO, 266: BANALIDADES DO COTIDIANO


 
    (Artigo publicado originalmente no Jornal Relevo - Setembro 2013)
 
Muito já foi discutido e escrito sobre as distinções entre os gêneros conto e crônica. Alguns teóricos insistem em enfatizar uma clara distinção entre os dois gêneros narrativos: o que configura o conto para um teórico como Massaud Moisés, é seu caráter ficcional, ao passo em que a crônica é um texto de não ficção, uma espécie de diálogo informal com o leitor. A coloquialidade é uma das características da crônica.

Porém, essa distinção não se sustenta muito, pois há vários exemplos de escritores que romperam certas barreiras que tornavam os gêneros diferentes entre si, como Rubem Braga, Moacyr Scliar, Carlos Heitor Cony e vários outros. Em Curitiba há exemplos de cronistas como Cristovão Tezza, Roberto Gomes, Miguel Sanches Neto, Domingos Pelegrinni (os dois últimos não são de Curitiba, mas publicam em periódicos da capital) que são exemplos de bons ficcionistas que não são tão relevantes na crônica, nesse bate papo com o leitor.

Carlos Dala Stella, artista plástico e poeta, é mais um exemplo de escritor que acerta nos contos e deixa muito a desejar nas crônicas (se seguirmos aqui as distinções entre os dois gêneros). Carlos Dala Stella, nascido em Curitiba em 1961, publicou em 2000 a coletânea de crônicas Riachuelo, 266, pela editora Criar. No volume há 26 textos que foram publicados em periódicos que abordam temas diversos, como idiossincrasias do povo curitibano, relação entre adultos e crianças, arte e literatura.

Com exceção dos belos Perdido beco sem saída, Uma casa em Campo Magro, Feliz Natal e um brinde à cólera, no qual tece considerações pertinentes sobre a novela Um copo de cólera, de Raduan Nassar, o restante das crônicas não tem vigor narrativo, abordam banalidades cotidianas parecendo que foram escritas por um escritor temeroso demais em errar e assim evitando abordar temas relevantes.

No texto homônimo, uma espécie de misto de conto, crônica e notícia policial, Dala Stella mostra-se um contista bastante original, construindo um narrador onisciente que interpela o leitor mostrando-se um assassino frio. As descrições de ambientes sórdidos do centro de Curitiba são bem exploradas, inclusive com referências geográficas precisas, que dão verossimilhança a atitudes brutais banalizadas do cotidiano. Vale ressaltar nesse conto a relação do texto com as imagens da capa do livro, que mostram dois agressores que invadem uma loja na Rua Riachuelo e, aparentemente sem motivo algum, atacam o proprietário com uma faca. A sequência dos quadrinhos da capa do livro simulam as ilustrações características de notícias policias da Tribuna, com traços de qualidade propositalmente duvidosa.

Como um todo, Riachuelo, 266 não apresenta grandes novidades. Tirando os textos citados, as crônicas não chamam a atenção para aspectos estruturais narrativos e retratam pequenos recortes óbvios e enfadonhos do cotidiano urbano. Difícil não bocejar durante a leitura.
Um fator que acaba se tornando muito ingrato aos cronistas é a própria natureza da crônica, que tende a ser, até certo ponto, descartável diante da enxurrada de informações que recebemos todos os dias. É um gênero que envelhece muito rápido, diferente do texto de ficção. O que Riachuelo, 266 apresenta de mais interessante são justamente os dois ou três contos do volume que, mesmo não salvando a obra, não a tornam completamente irrelevante. 

ESTRELA DIFUSA

  O tempo é o fator que talvez possa explicar melhor algumas coisas que simplesmente não escolhemos; ou melhor, insistimos em dizer que não ...